sexta-feira, 12 de abril de 2013

Dar uma mão...

(Foto retirada da Internet)

Era apenas mais um dia, igual a muitos outros. O tempo passava, devagar como sempre acontecia, e nada nem ninguém o poderia parar. Contudo não precisava de um relógio (também não o tinha) para saber as horas. A rotina diária faria isso com toda a perfeição.

O dia aproximava-se do fim, dando lugar à noite e ao brilho das estrelas. Sim, hoje teria como companhia o brilho das estrelas e daquele "C" radiante: a lua no seu quarto crescente, já que hoje o céu estava limpo, sem qualquer vestígio de nuvens.

Era chegada a hora de arrumar todas as suas parcas coisas naquele cantinho e subir avenida acima até ao ponto de encontro. Daqui a cerca de 2 horas iria estar com os seus antigos colegas. Mas ainda que fosse ter com eles, não "estaria com eles", mas sim do outro lado. 

Há dois anos atrás seria diferente. Há dois anos atrás reunir-se-ia com os seus colegas para que, depois de um dia de trabalho, preparassem tudo, devidamente dividido e acondicionado, para que então pudesse ser carregado na carrinha que levaria as "doses" de conforto para o local de encontro.

Hoje, como nos últimos dias, como nos últimos meses seria diferente. Hoje seria ele que iria ao ponto de encontro à procura da sua "dose" de conforto. Há um ano atrás a vida tinha sido ingrata para ele. A crise levara-lhe o emprego, e as poucas economias que tinha gastara-as em hospitais e clínicas, na tentativa de salvar o amor da sua vida, mas o cancro fora mais forte. 

Sem mullher, sem filhos, sem família, vira-se desempregado e sem dinheiro para pagar a renda da casa e todas aquelas despesas (água, luz, telefone) que para ele eram um dado adquirido quando tinha emprego.

Quase sem dar por isso viu-se a viver na rua, a dormir numa caixa de cartão (para cortar o frio que vinha do chão) e num cantinho onde se pudesse abrigar do vento e da chuva. Os balneários públicos passaram a ser uma visita diária. Todas as noites subia aquela avenida até ao ponto de encontro onde iria receber uma sopa e uma refeição quente, e por vezes um cobertor, ou até, em dias de sorte, uma peça de roupa para substituir as suas, desgastadas pelo tempo.

E assim foi. Encontrou os seus colegas de ronda, só que desta vez seria ele a receber a sua "dose" de conforto. A noite não estava fria e aproveitou para ficar um pouco a conversar com eles. O tempo passou depressa mas chegou a altura de se despedir, pelo menos até ao dia seguinte. Era chegada a hora de voltar para o seu "canto". 

A meio do percurso reparou num jovem, que por baixo de umas arcadas, estava deitado no chão junto de um banco. Há vários meses que fazia aquele precurso diariamente e nunca o por ali vira. Foi ter com ele e rapidamente se apercebeu que ele era novo por aquelas bandas, e que já não comia nada ia para 2 dias. 

Sentou-se ao lado dele e esticando o braço deu-lhe a sua comida: "Toma. Come tu. Eu hoje não estou com fome."

E ali ficou ele sentindo-se melhor do que se sentiria se tivesse ido para o seu canto com a sua "dose" de conforto.

Amanhã,..... seria outro dia!!!



Participação no tema de abril/2013 ("Altruísmo") da Fábrica de Letras

 
 

 

1 comentário:

João Roque disse...

Muito belo e tristemente actual.

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