sexta-feira, 25 de março de 2011

Suave brisa


O dia já ia longo estando quase a acabar. A luz dourada do sol que quase se sentava no horizonte era o prenuncio de uma noite de Outono que se aproximava velozmente. À sua volta um ensurdecedor silêncio, apenas quebrado de quando em vez pela harmoniosa melodia de um ou outro pássaro que por ali passava.

Maria estava sentada com o seu olhar fixo no horizonte. Um horizonte carregado de tons castanhos e alaranjados oriundos de longas árvores que ondulavam ao sabor do vento, produzindo um belo e suave murmúrio. O seu pensamento estava distante, muito distante dali. 

Maria deambulava calmamente por entre um conjunto de árvores que projectavam no chão as sombras ondulantes dos seus ramos e folhas. Junto delas existia um conjunto de bancos de jardim onde alguns idosos sentados conversavam entre si, quem sabe contando aventuras dos seus gloriosos tempos de juventude que não regressariam mais. Mais à frente existia uma elegante mesa de jardim, em ferro, onde dois homens de meia idade e tez morena aproveitavam o final do dia para jogarem uma calma partida de xadrez.

Maria caminhava lentamente sentindo no seu rosto a suave brisa do vento de Outono, ouvindo a melodia dos pássaros, o canto de uma cigarra mais à frente, o suave estalar das folhas alaranjadas caídas no chão, sempre que as pisava. 

Ao chegar junto de uns baloiços, Maria parou. Olhou para as correntes que suspensas de uma barra horizontal de metal estavam unidas por uma tira de lona preta que fazia de assento e decidiu sentar-se.

Começou a balançar lentamente as suas pernas e foi ganhando impulso, foi ganhando velocidade. Ao seu lado, no outro baloiço estava a sua filha de 7 anos, Rita, com os seus cabelos ruivos encaracolados a esvouçar na suave brisa de fim de tarde.

Maria foi ganhando velocidade, balouçando-se cada vez mais alto. Ritinha, a sua filha, tentava a todo o custo subir mais alto que a sua mãe, mas as suas pernitas pequenas não lhe facilitavam a tarefa. As duas, mãe e filha, competiam uma com a outra para ver quem subia mais alto, para ver quem conseguia tocar o Sol. A felicidade transbordava das suas faces, as gargalhadas sucediam-se acompanhadas pelo suave chiar das correntes dos baloiços. Os seus cabelos esvoaçam na suave brisa de fim de tarde. 

Nada nem ninguém poderia estragar aquele momento, aquele momento só delas, aquele momento em que mãe e filha se divertiam como se fossem duas irmãs, como se fossem as duas melhores amigas.

Maria ouviu então um sussuro do seu lado direito. Voltou a cara mas não viu ninguém. Apenas sentiu a brisa, a suave brisa do entardecer, que lhe provocou um arrepio frio que subiu pelas suas costas acima, uma sensação de desconforto. Voltou a cara para o seu lado esquerdo, para o outro baloiço, mas a sua filha, a sua Ritinha com os seus cabelos ruivos encaracolados não estava mais lá. O baloiço estava parado, apenas ondulando ao sabor da suave brisa.

Maria esticou as suas pernas e parou de repente. A sua filha não havia estado ali consigo. Maria tinha ido sozinha até ao parque, sentara-se no baloiço e começara a baloiçar. Queria voltar a sentir a mesma felicidade que tantas vezes havia sentido ali com a sua filha Rita. Mas a sua felicidade fora abruptamente cortada há três meses atrás quando a sua filha baloiçava ali mesmo e Maria havia voltado as costas para lhe comprar um gelado a um vendedor que por ali passava, e quando se voltou novamente a sua filha havia DESAPARECIDO.

Agora apenas Maria estava ali. Maria e a suave brisa do entardecer.

Será que algum dia Maria iria encontrar novamente a filha? O que lhe teria acontecido? Estaria bem? Estaria com frio? Estaria num baloiço?

Maria sentiu uma lágrima soltar-se, deslizar suavemente pelo seu rosto e secar-se com a suave brisa que soprava no final daquela tarde. A mesma suave brisa que tantas vezes sentira com a sua filha naquele jardim, naqueles baloiços.     
   
Esta é a minha participação na 10ª Edição visual do blog Projecto Créativité.

4 comentários:

Fê blue bird disse...

E que participação, parabéns!
Não deve haver pior dor do que perder um filho assim, e tu conseguiste neste teu texto transmitir isso mesmo.Adorei!

beijinhos e bom fim de semana

Mz disse...

A tua história é uma realidade. Infelizmente muitas crianças continuam a desaparecer diáriamente por todo o mundo.

Não conhecia este "projecto"

Déborah Macedo disse...

Primeira vez que passo por aqui e gostei muito, usa belas palavras... é bom aconchegar nelas ne, ainda mais pra expor injustiças?

tenho 2 blogs se quiser conferir:

http://coisasdeanitta.blogspot.com/(mais antigo)

http://senhoritadinamitt.blogspot.com/ (novo)

JoeFather disse...

Triste amigo, muito triste!

Parabéns por sua bela participação!

Abraços renovados!

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